DIREITO COM EMPATIA: O Valor da assistência jurídica humanizada

DIREITO COM EMPATIA: O Valor da assistência jurídica humanizada

Por João Dallapiccola

A assistência jurídica humanizada surge como um paradigma transformador no exercício da advocacia, transcendendo a mera aplicação técnica das leis para incorporar valores como empatia, acolhimento e compreensão das necessidades humanas. Em um contexto social marcado por desigualdades e vulnerabilidades, o advogado assume um papel que vai além da defesa processual, tornando-se um agente de transformação social.

Sendo assim, este artigo explora os diferenciais da assistência jurídica humanizada, sua importância para o profissional do direito e os impactos positivos gerados nos clientes, fundamentando-se em legislações, doutrinas e reflexões filosóficas e sociológicas.

A assistência jurídica humanizada diferencia-se pelo enfoque no indivíduo, considerando suas particularidades emocionais, sociais e culturais. Como ressalta o Código de Ética e Disciplina da OAB (Art. 2º), “o advogado deve exercer a profissão com dignidade e decoro, zelando por sua reputação e pela honra da classe”, o que inclui tratar o cliente com o respeito e a sensibilidade inerente da sua individualização.

A doutrina de Miguel Reale (2002) reforça que o direito deve ser visto como um fenômeno cultural, influenciado por valores sociais. Nesse sentido, a humanização do atendimento jurídico alinha-se à concepção de “Direito Fraterno” proposta por Antonio Carlos Wolkmer, que defende uma prática jurídica mais inclusiva e menos burocrática.

A empatia no exercício da advocacia não apenas qualifica o profissional, mas também fortalece a confiança na relação com o cliente. Como destacou o filósofo Emmanuel Lévinas, “a ética se manifesta no rosto do outro”, indicando que o advogado deve enxergar no cliente não apenas um caso, mas uma pessoa com histórias e angústias.

É certo que o advogado não exerce, nem deve exercer, funções próprias da psicologia clínica. No entanto, a prática jurídica, especialmente no âmbito do atendimento ao cliente, exige uma escuta qualificada e empática.

Essa escuta não configura atividade terapêutica, mas sim uma ferramenta profissional voltada à compreensão integral da demanda jurídica apresentada.

Ao receber os relatos do cliente, o advogado deve estar apto a identificar os elementos fáticos e emocionais que influenciam a narrativa, sem ultrapassar os limites éticos e técnicos da advocacia. Essa postura contribui para o fortalecimento da relação de confiança, essencial à prestação de serviços jurídicos eficazes, e permite a construção de estratégias jurídicas mais adequadas ao contexto individual do assistido.

A Resolução nº 188/2018 do CNJ estabelece diretrizes para uma escuta qualificada no Judiciário, princípio que se estende à advocacia. Ao adotar uma postura humanizada, o advogado cumpre não apenas seu papel técnico, mas também social, contribuindo para a efetivação do acesso à justiça, conforme preconizado por Cappelletti e Garth (1988) em “Acesso à Justiça”.

Para o cliente, especialmente os em situação de vulnerabilidade, a assistência humanizada reduz a sensação de impotência perante o sistema jurídico. O sociólogo Pierre Bourdieu já alertava sobre a “violência simbólica” presente nas instituições, onde a linguagem técnica pode excluir. Uma abordagem empática, portanto, democratiza o direito.

Se a humanização é um pilar da advocacia contemporânea, a formação jurídica precisa ir além do estudo de códigos e jurisprudências. Como defende o filósofo Edgar Morin, “a educação deve ensinar a compreensão humana”, preparando profissionais capazes de lidar com conflitos de maneira pacífica e resolutiva.

Nesse sentido, a Lei nº 13.460/2017 (Código de Defesa dos Usuários dos Serviços Públicos) reforça o princípio do atendimento digno, que deve ser ampliado à advocacia, especialmente no trato com cidadãos em situação de vulnerabilidade. Embora voltada aos serviços públicos em geral, a lei inspira uma atuação jurídica pautada na cortesia, no respeito e na escuta qualificada, pilares que fortalecem a confiança do cliente no sistema de justiça e consolidam a humanização como valor ético da profissão.

A assistência jurídica empática tem um efeito multiplicador na sociedade. Quando um advogado atua com humanidade, ele não apenas resolve um caso individual, mas fortalece a noção de que o direito pode (e deve) ser um instrumento de equidade.

Por fim, a assistência jurídica humanizada não constitui um privilégio, mas sim uma exigência ética e social. Ao conciliar a técnica jurídica com a sensibilidade humana, o advogado fortalece a confiança no sistema de justiça e promove uma atuação mais justa, inclusiva e eficaz. O acolhimento realizado pelo profissional do direito representa uma dimensão humanizada da prática jurídica, em consonância com os princípios da dignidade da pessoa humana e do acesso à justiça. Como demonstrado, essa perspectiva encontra respaldo em legislações, doutrinas e reflexões filosóficas, confirmando que o direito, em sua essência, deve servir às pessoas — e não o contrário.
Matéria escrita em conjunto com a Doutora Jociane Neves, advogada.