Defensores de direitos humanos pedem por medidas de segurança
Integrantes de movimentos sociais deram sugestões para serem agregadas ao plano de proteção aos defensores dos direitos humanos
A proteção de defensores dos direitos humanos, comunicadores e ambientalistas foi tema de audiência pública da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa (Ales) nesta sexta-feira (3). Os presentes debateram a construção de um Plano Nacional de Proteção para essas pessoas. O evento foi realizado no auditório Wladimir Herzog, da Defensoria Pública Estadual (DPES), centro de Vitória.
Na abertura dos trabalhos a presidente do colegiado, deputada Camila Valadão (Psol), falou que o tema é desafiador e que existem muitas violações no Espírito Santo e no Brasil. “Temos inúmeros casos de pessoas assassinadas em nosso país, principalmente, por questões vinculadas a terra, a comunidades tradicionais e a povos originários. Entre 2019 e 22 foram 1.171 violações contra defensores, 169 foram assassinados”, frisou.
Ela contou que a comissão recebe diversas denúncias de violações e toma as devidas providências. Questões fundiárias, ligadas aos quilombolas e raciais estão entre os principais assuntos. “Ontem tivemos um incêndio num terreiro de umbanda em Vila Velha, mostrando mais uma vez o racismo religioso”, ressaltou.
Galdene dos Santos, presidente do Conselho Estadual dos Direitos Humanos, lembrou que o Brasil é um dos países que mais mata defensores de direitos humanos e que no Estado, apesar dos avanços, ainda existem problemas. Ela destacou que o evento era uma oportunidade de coletar contribuições para o plano nacional. Também relatou que no momento 47 defensores estão sob ameaça no Espírito Santo.
Secretaria de Direitos Humanos
Quem também esteve na audiência foi Nara Borgo, secretária de Estado dos Direitos Humanos, que pontuou que entre 2019 e 22 não havia diálogo junto ao governo federal, mas que a partir de 2023 as coisas voltaram a avançar. A boa notícia trazida por ela é que nesta sexta foi publicado o edital para selecionar uma organização para gerenciar o Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) no Estado.
Assim, em breve, devem estar em funcionamento simultaneamente além do PPDDH, o Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAM), o Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas (Provita) e o Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura (Mepet).
De acordo com Borgo, os conflitos fundiários estão entre as demandas mais tratadas pela pasta comandada por ela. A secretária trouxe outra informação para os presentes: o governo do Estado sinalizou para o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) a doação de um terreno em Palhal, Linhares, para a criação de um assentamento. O local é solicitado há alguns anos por movimentos que lutam pela reforma agrária.
Segundo Hugo Fernandes Matias, do Núcleo Especializado de Direitos Humanos da Defensoria Pública (DPES), o papel da instituição é justamente o de defender os direitos humanos. Ele destacou que há uma preocupação com a “guinada” legislativa no país, com uma série de projetos sendo protocolados que trazem retrocessos, como os relacionados com a flexibilidade do porte de armas.
Proteção
Uma das participantes foi Flávia dos Santos, representante da comissão quilombola de Sapê do Norte, território entre Conceição da Barra e São Mateus. Ela está inserida num programa de proteção federal há três anos, mas afirmou que não se sente protegida. “Ainda não entendi qual a proteção que tenho. O Espírito Santo tem histórico de violência contra quilombolas, temos 11 no programa”, salientou.
Para a quilombola, é preciso planejar muito bem as ações para construir um plano que realmente seja efetivo. “O programa tem que ser executado de acordo com as nossas demandas. O povo de Brasília protege a gente pelo WhatsApp. Tendo pelo Estado teremos um diálogo mais próximo, que precisa estar próximo do nosso território”, cobrou.
O vereador por Vitória André Moreira (Psol) citou outro grupo que merece proteção: a população em situação de rua. Ele mencionou que existem defensores sendo ameaçados na Capital e demonstrou solidariedade ao Padre Kelder. “Teve sua paróquia invadida ilegalmente pela Polícia Militar porque denunciou a violação da vida de moradores do Território do Bem. Somos solidários à causa dele”, enfatizou.
Ministério
A representante da coordenação-geral do PPDDH, do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), Ingrid Hrusa, participou de forma virtual e comentou que o programa é um dos instrumentos que devem compor o plano nacional. No momento, existem 1.139 pessoas aguardando para inserção no programa, sendo 27 no Espírito Santo. Ela garantiu que enquanto o processo está tramitando essas pessoas já estão recebendo algum tipo de atendimento.
Hrusa citou a importância de avançar em várias questões para tornar o programa mais sólido. Entre os desafios estão aperfeiçoar os protocolos de segurança que precisam ser lançados num primeiro momento para garantir a segurança dos defensores; e a proteção coletiva, para o qual está se buscando parcerias para levar recursos para as comunidades. Ela informou que o termo de convênio assinado com o Estado tem prazo de 36 meses e que mais de R$ 5 milhões em recursos devem ser aplicados.
Um dos responsáveis pela construção do plano nacional e do anteprojeto é o Grupo de Trabalho Técnico (GTT) Sales Pimenta, composto por integrantes do governo federal e representantes da sociedade civil. O grupo foi criado pelo Decreto Federal 11.562/2023 e leva o nome de Gabriel Sales Pimenta, advogado e defensor de direitos humanos assassinado em 1982 no Pará.
Letícia Souza, integrante do grupo, que também participou de forma virtual, falou que o GTT trabalha com quatro eixos temáticos: proteção popular, institucionalidade protetiva, investigação e responsabilização e medidas protetivas e de reparação. Ela pontuou que serão feitas audiências públicas para ouvir a população e que estão no momento de colher as contribuições.
Contribuições
Diversos representantes de movimentos sociais usaram a palavra para apresentar suas respectivas demandas. Eliandra Fernandes, do MST, comemorou o retorno do PPDDH no Espírito Santo. Para ela, o Estado falha quando não faz uma reforma agrária e permite famílias acampadas debaixo de lonas pretas há mais de 10 anos. A sugestão dela foi o fortalecimento da proteção coletiva dos defensores.
Já Daniela Meirelles, do Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), lembrou que o programa já funcionou muito bem no Estado, mas que acabou sendo descontinuado. “A situação só não foi pior por conta da rede popular de proteção”, disse. Ela destacou a importância de responsabilizar os violadores e pediu mais segurança, equipe jurídica e psicológica, além de recursos para as pessoas que precisarem sair dos territórios em virtude de ameaças.
Teresino Piedade, da comunidade Angelim 1, em Conceição da Barra, Sapê do Norte, contou que houve um incêndio na localidade e até hoje eles aguardam a resposta da Justiça. Ele apontou falta de compromisso da Polícia Militar com a comunidade e acredita que um programa estadual vai fortalecer a proteção dos defensores. “A gente precisa que essas medidas protetivas sejam mais eficientes”, disse.
Integrante do Centro de Defesa dos Direitos Humanos (CDDH) da Serra, Marta Falqueto comentou que de 2007 a 17 o centro coordenou o programa de proteção no Estado, no entanto, o mesmo foi abruptamente suspenso por causa de denúncias de desvio de recursos públicos que não se confirmaram. Ela conclamou as pessoas a estudarem o edital do programa para fazer as devidas contribuições e reforçou que é preciso realizar a proteção integral dos defensores e ouvi-los para a construção do programa.
Além dos citados, participaram do encontro Lucia Martins e Carla Ferreira de Souza, do coletivo Mães Eficientes Somos Nós; Paulo César, da Sociedade Maranhense dos Direitos Humanos; Verônica Bezerra, do Centro de Apoio aos Direitos Humanos; Gleyce dos Santos da Vitória, da Anistia Internacional no ES; Isaías Santana, do movimento negro capixaba; João Neto, ambientalista; Antônio Sapezeiro, quilombola; Patrícia Colombo, da comunidade Angelim I; Ricardo Gobbi, da Comissão de Promoção da Dignidade Humana (CPDH); e Gilmar Ferreira, defensor dos direitos humanos.
Fonte: Assembleia Legislativa
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