Ales debate Plano de Descarbonização estadual

Ales debate Plano de Descarbonização estadual

Medidas propostas pelo governo para neutralizar as emissões de gases de efeito estufa foram apresentadas em reunião na Ales

A Frente Parlamentar para Análises e Proposições sobre a Mudança Climática, presidida pelo deputado Mazinho dos Anjos (PSDB), recebeu nesta sexta-feira (15) a equipe técnica e as autoridades estaduais envolvidas na elaboração do Plano de Descarbonização e Neutralização das Emissões de GEE (Gases de Efeito Estufa) do Espírito Santo. O plano será lançado oficialmente na próxima semana.

A metodologia do plano foi apresentada pelo coordenador geral do projeto, PhD em Engenharia Ambiental, Neyval Costa Reis Júnior. Neyval é professor do Núcleo de Estudos da Qualidade do Ar e do Instituto de Estudos Climáticos da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).

O pesquisador destacou que a principal estratégia capixaba esteve em colocar os especialistas da academia para atuarem como mediadores entre governo e setores produtivos. “Essencialmente, falar de descarbonização é falar muito sobre economia. Falar sobre indústria, transporte e agricultura. E a agropecuária é um setor extremamente importante, pois tem a missão importante de deixar de ser emissor e ser captador (de CO2)”, alertou Júnior.

Fotos da reunião

A meta central do plano é o ES chegar em 2050 neutro quando o assunto é carbono. “É um plano de longo prazo e para isso é preciso primeiro garantir a adesão dos setores econômicos”, ressaltou o docente. O plano não teria uma abordagem regulatória, mas de gerar políticas de incentivo, com o ES sendo um “estado catalisador”.

O fato de grandes empresas como a ArcelorMittal, a Vale e a Petrobras já terem suas políticas de baixo carbono mostra a importância do plano estadual conversar com as sinalizações delas. “O setor produtivo dá o input e a gente traz pra dentro do plano”.

“O assunto para as grandes empresas não é mais ‘se vamos, já estamos no processo’. E essa é a boa oportunidade para o ES. Se boa parte da economia já decidiu para onde está indo, a gente pode movimentar os outros setores menores, a pequena, a média indústria. Pequenos fornecedores, afinal de contas, se os grandes estão querendo descarbonizar, em algum momento eles vão perguntar se os fornecedores estão sendo descarbonizados. Esse tipo de ação é o que chamamos de estado catalisador”, explicou.

A própria decisão do Poder Executivo em só usar frota de veículos alugados movidos a biocombustíveis seria um exemplo do contratante induzindo à geração de um serviço em novos moldes.

Setores

O estudo da situação capixaba mostra quais seriam os “setores” com maior participação nas emissões de gases, como siderurgia, pecuária, desmatamento, importação de eletricidade, pastagem degradada, caminhões, petróleo e gás natural, indústria e mineração, produção de eletricidade.

Segundo o palestrante, o segmento de energia e indústria teve mais envolvimento no debate, “pois está intimamente relacionado às decisões que estão sendo tomadas, as rotas que vamos discutir, os estímulos que a gente vai precisar, as regulações que vamos precisar fazer”.

Alguns nichos, como a agricultura, podem passar de emissor para captador nas próximas décadas, ou seja, apresentar um feliz “número negativo” de participação. “Pastagem bem manejada vira sumidouro de carbono”, lembrou.

A estimativa é de que o setor tecnicamente conhecido como “AFOLU” (agropecuária, florestas e uso do solo) vá de + 6,64% em 2021 para -7,3% em 2050. “Agricultura de baixo carbono. O setor hoje aparece como vilão emitindo, depois ele vira o bonzinho”, apontou o professor.

Sobre reflorestamento, foi colocada a necessidade de desmistificar o tamanho do tema na relação com carbono. A estratégia de reflorestar a Mata Atlântica, por exemplo, tem por meta chegar em 2050 reflorestando 60 mil hectares e mitigando apenas 0,36 milhões de toneladas de CO2 por ano. A emissão total no ES hoje é de 30 milhões de toneladas. “Reflorestar é legal, mas não vai resolver o problema. Precisamos de ações mais profundas”, afirmou.

Expectativas

O coordenador dos estudos finalizou sua apresentação ressaltando que o sucesso do plano vai exigir sinergia entre os setores. “Todos os cenários foram aprovados pelo governo e pelos setores, mas é preciso política pública para garantir essas estratégias. Não adianta apenas dizer ‘vamos trocar carvão por gás natural’”.

Para garantir a governança, a nova abordagem contará com quatro comitês, que devem analisar como implementar as ações a curto, médio e longo prazo: o Financeiro e Incentivos tributários; o de Desenvolvimento Regional; o de Instrumentos Regulatórios e Meio Ambiente; e o de Pesquisa e Desenvolvimento e Acesso à Rede.

Infraestrutura

Presente no plenário, o diretor de Assuntos Corporativos da Companhia de Gás do Espírito Santo (ES Gás), Walter Fernando Piazza Junior, trouxe outra reflexão. Para o representante da empresa, se vê “muitas rotas tecnológicas para chegar ao marco zero”, mas o gargalo de infraestrutura deveria ser um debate anterior no País.

“Não há transição energética se não houver rede de distribuição, seja elétrica, seja de gás. Os insumos renováveis deverão ser entregues onde demandados. É importante termos em mente a necessidade da infraestrutura, porque quando comparamos com a Europa e com os Estados Unidos, fazemos analogias que esquecem que lá já existe a infraestrutura implantada”, ponderou.

“Hoje qualquer cidade, vilarejo do interior (Europa e EUA) já tem gás e energia. É assim que vai levar, fazer a distribuição dos combustíveis renováveis, o eólico, o biometano, o hidrogênio(…) Não pode ficar limitado (Brasil) às cidades litorâneas onde as indústrias já estão instaladas. Precisa-se levar indústria para ver o desenvolvimento no interior. Infraestrutura é fundamental, se assim quisermos ter sucesso”, defendeu Walter Piazza.

Mesa

A mesa do debate contou com a presença do secretário de Estado de Meio Ambiente, Felipe Rigoni, que destacou a importância da frente parlamentar para acompanhar o plano na execução pelos próximos 26 anos. “É um plano não só de governo, mas da sociedade, de todos os setores que se envolvem”.

Também fizeram parte do debate: o presidente da Fetransportes, Renan Chieppe; o desembargador do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) Jorge Henrique Valle dos Santos; o  presidente da Comissão de Direito Ambiental da (OAB-ES), Alexandre Iunes Godinho Araújo; e Marcelo Saintive, diretor-presidente do Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo (Bandes).

Para o representante da Fetransportes, a iniciativa se encaixa não só com anseio do governo, mas do setor produtivo e da sociedade. A entidade tem uma posição aberta na discussão, garantiu Chieppe, pois “o setor não tem posição nem a favor nem contra a qualquer combustível, somos a favor de todos, desde que aplicado na sua eficiência e na sua sustentabilidade”.

Ele explicou que se a idade média da frota de caminhão no Brasil é de 20 anos, há na estrada brasileira veículo mais moderno que polui 20 vezes menos que os mais velhos ainda em circulação. “Basta renovar a frota que (o setor) já vai contribuir com a redução”, concluiu.

Citando o Dia Nacional da Conscientização sobre as Mudanças Climáticas (16 de março), o representante da OAB, Alexandre Araújo, pediu o não esquecimento de que “os que mais sofrem com as mudanças climáticas são os mais pobres, os mais necessitados”.