Efeitos da Lei Magnitsky no Brasil e seus impactos na economia, na justiça e na sociedade

Por João Dallapiccola
A Lei Magnitsky nasceu nos Estados Unidos, em 2012, como resposta à morte do advogado russo Sergei Magnitsky, que, após denunciar um esquema de corrupção bilionário envolvendo autoridades estatais, foi preso, torturado e morreu sob custódia.
O caso provocou repercussão internacional e levou o Congresso americano a criar um mecanismo jurídico para punir, de forma direcionada, pessoas físicas e jurídicas responsáveis por graves violações de direitos humanos e corrupção em larga escala.
Originalmente restrita à agentes russos, a lei foi expandida em 2016 pelo Global Magnitsky Human Rights Accountability Act, permitindo que os EUA aplicassem sanções a qualquer pessoa, de qualquer país, que fosse considerada responsável por violações semelhantes.
Desde então, diversos países, tais como Canadá, Reino Unido e Austrália, criaram legislações inspiradas nesse modelo.
A essência da lei está em individualizar a punição, evitando sanções coletivas que afetem populações inteiras e mirando diretamente os responsáveis.
Objetivos centrais da Lei Magnitsky
Em suma, a Lei tem o objetivo principal de punir indivíduos e entidades envolvidos em corrupção e violações graves de direitos humanos, congelar bens e ativos nos EUA ou em jurisdições parceiras, restringir viagens, negando vistos e acesso ao território americano, e por fim, excluir sancionados do sistema financeiro internacional, dificultando transações em dólar e acesso a bancos.
Exemplos práticos de aplicação da Lei
Após a vigência da lei, já é possível identificar sua aplicação em alguns momentos emblemáticos da história recente.
Na China (Xinjiang), autoridades chinesas foram sancionadas por supostos abusos contra a minoria étnica uigur, com congelamento de bens e proibição de entrada nos EUA.
Enquanto no Mianmar, os militares e líderes civis sofreram bloqueio de ativos após massacres contra a população rohingya.
Da mesma forma, recentemente no Brasil, autoridades brasileiras, incluindo membros do Judiciário, foram alvos de sanções por supostas violações a direitos civis e políticos, com restrição de vistos e bloqueio de patrimônio.
Assim, apesar de não ser uma lei brasileira, a Lei Magnitsky impacta diretamente os países alvos, uma vez que porque o sistema financeiro global é fortemente vinculado ao dólar e às regras americanas.
Indubitavelmente, muitas empresas brasileiras dependem de exportações, importações e financiamentos internacionais, o que é diretamente impactado nesse tipo de cenário.
Além disso, sanções contra autoridades ou empresários podem gerar efeito dominó na economia e na política, fomentando instabilidades.
Não menos importante, é impreterível o destaque aos impactos econômicos diretos no cenário brasileiro com a aplicação da referida lei.
Devido à aplicação, a fuga de capitais e retração de investimentos aumenta, pois, investidores estrangeiros tendem a evitar países que entram em atrito diplomático com potências econômicas.
Sanções contra autoridades brasileiras podem transmitir uma imagem de instabilidade jurídica e política, reduzindo investimentos estrangeiros diretos (IED).
Além disso, com a restrição de acesso ao sistema financeiro internacional, empresas ligadas a pessoas sancionadas podem perder acesso a bancos estrangeiros, linhas de crédito e sistemas de pagamento internacionais, como SWIFT.
A aplicação da Lei também afeta o comércio exterior, considerando que exportadores e importadores brasileiros podem sofrer atrasos ou bloqueios se houver suspeita de ligação com sancionados, prejudicando setores estratégicos como o agronegócio, mineração e tecnologia.
Outro desdobramento é o isolamento tecnológico, isso porque, plataformas digitais e empresas de tecnologia americanas podem bloquear o acesso de sancionados a serviços de nuvem, hospedagem e redes sociais, impactando também startups e operações de marketing internacional.
Além dos impactos que a aplicação da Lei afeta diretamente o Brasil, ainda existem os impactos indiretos sofridos por todo e qualquer país ou figura nacionalmente reconhecida.
Com a valorização do dólar e a inerente pressão inflacionária, afetando preços de combustíveis, alimentos e insumos industriais, percebe-se que, por mais indiretos que sejam as consequências, os seus reflexos são exorbitantes.
Merece destaque também a pressão indireta sobre a balança comercial, com perda de competitividade em setores que dependem de mercados norte-americanos ou aliados.
Repercussões jurídicas no Brasil
É necessário ainda refletir quais seriam as repercussões jurídicas no Brasil, com a aplicação da Lei Magnitsky, sendo possível elencar como principais repercussões a atuação de advogados e de escritórios.
Por exemplo, advogados que assessorem clientes sancionados precisam adotar rígidos protocolos de compliance, sob pena de violar regras internacionais e sofrer penalidades.
Da mesma forma, escritórios de advocacia podem ter contratos rescindidos com clientes no exterior por risco reputacional.
Assim, casos envolvendo aplicação indireta da Lei Magnitsky no Brasil podem abrir debates sobre soberania, imunidade de jurisdição e limites da extraterritorialidade.
Dessa forma, embora a lei seja direcionada a indivíduos específicos, seus efeitos macroeconômicos podem atingir a população por meio de inflação decorrente da desvalorização cambial, dificuldade de acesso a serviços financeiros internacionais para empresas brasileiras.
Comparação com outros mecanismos internacionais
Deve-se destacar que a Lei Magnitsky se diferencia de embargos tradicionais, pois não atinge países inteiros, mas indivíduos e entidades e por ser mais rápida na aplicação, dispensando longos processos diplomáticos.
Sendo assim, pode ser aplicada de forma coordenada com outros países, ampliando seu alcance.
Posicionamento de entidades brasileiras
A OAB-SP já se manifestou contra a aplicação da Lei Magnitsky a autoridades brasileiras, alegando violação da soberania nacional e interferência na independência judicial.
Por outro lado, organizações de direitos humanos defendem que a medida ajuda a combater impunidade transnacional.
Contudo, é possível concluir que a Lei Magnitsky é um instrumento jurídico internacional poderoso, capaz de atingir diretamente indivíduos envolvidos em corrupção e violações de direitos humanos, independentemente de sua nacionalidade.
Para o Brasil, seu impacto vai além das sanções pessoais: pode gerar repercussões na economia, na imagem internacional e na estabilidade política.
Investidores podem se afastarem, cadeias de exportação podem ser prejudicadas e o custo do crédito pode subir.
No campo jurídico, advogados e empresas precisam se adaptar a exigências de compliance cada vez mais rigorosas.
Em um mundo globalizado, mesmo leis estrangeiras podem afetar profundamente o cotidiano nacional e a Lei Magnitsky é um exemplo claro de como política, economia e justiça se entrelaçam no cenário internacional.
Escrito pelos Advogados João Batista Dallapiccola Sampaio e Francisco de Assis Portela Milfont

Advogado há 39 anos, especializado em direitos sociais e graduado pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), é pai orgulhoso e avô realizado, com uma trajetória marcada pelo compromisso com a justiça e a ética profissional.