Entrevista com Jack Rocha: “O machismo é produto do patriarcado que se expressa em diferentes setores da nossa sociedade e também nas estruturas do Estado, que não é neutro”
O Consórcio de Notícias do Espírito Santo (CNES) e os portais de notícias do grupo Política Capixaba estão a duas entrevistas de concluírem a série especial do mês em que se comemora o Dia Internacional da Mulher.
Ao longo deste mês, foram entrevistadas a Juíza Coordenadora de Combate à Violência Doméstica, Hermínia Azoury; a Deputada Estadual, Camila Valadão; a Capitão do Corpo de Bombeiros Andreza Nascimento; a Vereadora de Vila Velha, Patrícia Crizanto; a Primeira Dama do Espírito Santo, Maria Virgínia Casagrande; a economista Isabel Berlinck; a médica e pesquisadora Patrícia Deps e a líder comunitária, Zety Araújo.
A penúltima entrevistada desta série especial é a única mulher eleita em 2020 para representar os capixabas na Câmara dos Deputados e também a primeira mulher negra a ocupar esse espaço pelo Espírito Santo.
A Deputada Federal Jackeline Rocha foi a oitava candidata mais votada do Estado, com cerca de 50 mil votos.
Em 2018, ela havia se candidatado à governadora e conseguiu mais de 140 mil votos. Em 2020, chegou ao segundo turno como candidata a vice-prefeita da capital Vitória.
Jack Rocha também foi a primeira mulher a assumir a presidência estadual do Partido dos Trabalhadores (PT).
Além de já fazer parte da história, a deputada afirma que sua atuação é direcionada para que outras mulheres ocupem espaços de destaque na sociedade e para que as ações de políticas públicas mudem a estrutura social brasileira, baseada no racismo, que extermina mulheres e jovens.
Confira a entrevista nove da série especial do Mês das Mulheres:
O que representa ser a primeira mulher negra eleita Deputada Federal pelo Espírito Santo? Quem são suas referências femininas de coragem e valores?
Ser a primeira mulher negra eleita deputada federal é uma conquista que vivencio a partir da luta das mulheres negras do Brasil e do Espirito Santo e, é uma honra. Entretanto, também uma responsabilidade nesse processo de democracia representativa.
Trago comigo tudo que aprendi junto dos movimentos sociais. Muitas são as mulheres que lutaram para mudar nossa realidade, algumas das nossas ancestrais nem mesmo são reconhecidas nesse processo histórico, mas estamos aqui por causa delas e reafirmamos nosso compromisso de continuar movimentando essas estruturas na busca de transformações.
São sempre inspiradoras, Dandara dos Palmares, Zacimba Gaba, Carolina de Jesus, Conceição Evaristo, Suely Carneiro, Maria Clara, Benedita da Silva, Marielle Franco, Ângela Davis e tantas outras.
A Bancada Feminina tem feito uma série de propostas ligadas aos direitos da Mulher. Acha que essa visibilidade vai se manter ao longo do ano? Enumere os Projetos de Lei que contam com o seu apoio.
Com certeza essa visibilidade será ainda maior. Estamos retomando nesse ano a luta das mulheres por políticas públicas e por exemplo, a recriação do Ministério das Mulheres vai contribuir para aumentar essa visibilidade. Colocará novamente o debate sobre importantes pautas da luta das mulheres no centro do debate nacional.
Também estamos estabelecendo novas frentes para concretizar mudanças reais na vida das mulheres a partir do parlamento.
Os projetos de lei apresentado e que contaram com meu apoio foi o que aprimora as condições de contratação e de renegociação das operações do Programa Nacional de Apoio as Microempresas e Empresas de Pequeno Porte – PRONAMP, garantindo 20% no âmbito do PRONAMP destinado a financiamento as micro empresas e empresas de pequeno porte controladas e dirigidas por mulheres e, destes , 30% será destinado a empresas controladas e dirigidas por mulheres negras.
Também tiveram meu apoio o projeto que Cria o Selo Empresa Amiga da Mulher; Projeto de Lei que acrescenta ao Código Penal tratamento do crime de condicionamento de dever a prestação de atividade sexual; Projeto de Lei que Institui o Programa de Prevenção ao Assédio Sexual e demais crimes contra a dignidade sexual e a violência sexual, no âmbito da administração pública, federal, estadual e municipal; o Projeto de Lei que Explicita os Direitos da Mulher nos Casos de Cirurgia Plástica de Mama; Institui Pensão Especial aos Filhos e Dependentes Menores de Idade em Razão do Crime de Feminicídio.
Que avaliação a senhora faz da sua atuação nesses primeiros meses de mandato? Como é sua relação com as outras parlamentares?
Creio que a avaliação é positiva, mesmo com todos os desafios que uma mulher negra enfrenta nesse espaço de poder. Tenho buscado enfrentar todos os desafios com muita coragem e perseverança.
Tenho uma boa articulação com a bancada feminina na Câmara e essa bancada com prometida com a luta das mulheres tem mostrado unidade.
Sou hoje Vice-Líder da Liderança da Bancada da Federação Brasil da Esperança na Câmara, sou titular da Comissão Permanente da Indústria, Comercio e Serviço e Suplente nas Comissões de Direitos Humanos, Minorias e Igualdade Racial e, como também, da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher.
Quais são os planos do seu mandato para até o fim de 2023? Já consegue citar alguma conquista?
O Plano é que o mandato tem mais proximidade com os movimentos sociais, a defesa intransigente do Governo Lula, etc.
Conseguimos já interromper a venda do Prédio do antigo IAPI em Vitoria, ES que retoma a sua finalidade de habitação popular, a articulação junto ao governo para liberação de recursos orçamentários para auxiliar as prefeituras, principalmente em infraestrutura, a suspensão do ato de desocupação da Academia de Letras e Artes de Conceição da Barra no imóvel da União.
A senhora percebe união entre os parlamentares da Bancada Capixaba, no que se refere aos Direitos da Mulher?
A bancada capixaba está unida no que se refere a busca de recursos para o desenvolvimento do estado. Tem sido muito respeitosa o convívio entre nós.
Como pensava em contribuir para o ES quando candidata a Governadora e como pensa que será sua contribuição como Deputada Federal?
No caso da disputa ao poder executivo registrei um programa de ação junto ao Tribunal Regional Eleitoral que está disponível ao público onde aponto as politicas publicas necessária ao desenvolvimento social, econômico e cientifico de nosso estado. Tenho como compromisso me empenhar como deputada no mesmo sentido.
Como define a sua relação com o Governo do Estado? Está otimista com o panorama político que se moldou este ano?
A minha relação pessoal e como Presidenta do PT no ES tem sido com o Governador do Estado tem sido respeitosa, transparente e equilibrada. Somos parte do governo que é nosso parceiro e o meu mandato está à disposição deste governo.
Que avaliação faz das condições da mulher, no que se refere ao mercado de trabalho, direitos e oportunidades?
Uma das condições fundamentais para a emancipação da mulher é sua participação no trabalho. As injustiças estão expostas principalmente através da alta diferença salarial existente entre homens e mulheres.
O governo Lula apresenta à Câmara um projeto de Lei que trata de trabalho igual, salário igual. Este projeto está tramitando e sob análise das Comissões de Mérito desta Casa de Lei.
Quais políticas públicas se fazem prioritárias para erradicar os efeitos da cultura do machismo? Quais outras seriam necessárias para reduzir o problema da segurança pública e da violência contra a Mulher?
O machismo é produto do patriarcado que se expressa em diferentes setores da nossa sociedade e também nas estruturas do Estado, que não é neutro.
As políticas públicas para as mulheres são um instrumento importante para descontruir o machismo, desonerar todo o peso da desigualdade social, econômica e política que esse sistema social coloca na vida das mulheres. É então necessário pensar nas políticas públicas de forma a considerar a pluralidade das mulheres e suas especificidades em toda gestão pública.
Hoje vivenciamos a retomada de políticas públicas que possam enfrentar esse fenômeno social com a responsabilidade de todos entes federados, já que passamos seis anos sem recursos suficientes para esse enfrentamento no Brasil.
Tanto a segurança pública como o enfrentamento a Violência Contra as Mulheres necessitam de investimentos públicos efetivos.
É necessário retomar o debate em diferentes eixos que juntos podem transformar realidades. Necessitamos efetivar políticas de prevenção que colaboram para que a violência não ocorra. É preciso também termos serviços que deem conta de acolher, cuidar e proteger as mulheres em situação de violência, serviços esses que possam funcionar durante 24 horas e 7 dias na semana e por último aprimorar os serviços de contenção da violência.
O que o Espírito Santo pode esperar nesses anos em que seguirão o seu mandato?
Reafirmo que o nosso mandato estará empenhado na efetivação de políticas públicas de inclusão social. Estou envolvida nas discussões ao enfrentamento da pobreza, da extrema pobreza, da fome, do desemprego e das mudanças na situação social e econômica do País.
E como nos ensinou Angela Davis, “quando uma mulher negra se movimenta, toda a estrutura da sociedade se movimenta com ela”, o nosso mandato estará comprometido em movimentar para melhor a vida das mulheres negras e entre elas das jovens negras.
Carlos Mobutto | Jornalista da AZ
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