Governo prevê reduzir ainda mais gasto com pessoal, após menor marca da história em 2021
Os gastos do governo com pessoal, que atingiram em 2021 a menor marca da série histórica, devem continuar caindo nos próximos anos em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), segundo previsão do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2023 enviado pelo Executivo ao Congresso Nacional.
Em 2021, os gastos com pessoal foram de 3,8% do PIB. A previsão da equipe econômica é que cheguem a 3,1% em 2025.
A série histórica dos gastos com pessoal começou em 1997. A comparação dos gastos em relação ao PIB é considerada a mais adequada por especialistas.
Mesmo caindo na proporção com o PIB, de acordo com o Ministério da Economia, os gastos com pessoal devem ter um aumento em números absolutos nos próximos anos, passando de R$ 348,1 bilhões em 2022 para R$ 363,1 bilhões em 2025.
Segundo o Ministério da Economia, a previsão de queda nos gastos com pessoal nos próximos anos, na comparação com o PIB, leva em conta:
a manutenção da atual folha de servidores
os reajustes já contratados
previsão de contratações para 2022 — além do valor de R$ 11,7 bilhões reservado para reajustes em 2023
Reforma administrativa ‘invisível’
Em evento realizado em fevereiro deste ano, o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que a área econômica vem implementando uma reforma administrativa “invisível” nos últimos anos, ou seja, sem a necessidade de mudança nas leis.
Segundo ele, o atual governo agiu ao contrário dos anteriores, que contrataram 160 mil funcionários e concederam aumento de 50% acima da inflação aos servidores.
“Enquanto a população brasileira está nesse sufoco total, com crise de estagnação econômica, tinha corrupção na política, um caos instaurado no Brasil. E havia uma percepção em Brasília de que aquilo era uma ilha da fantasia, que aquilo estava acima do Brasil. Ao invés de serem servidores públicos, eram autoridades. Nós estamos lembrando a todos que são servidores públicos”, declarou Guedes na ocasião.
O ministro também disse, naquele momento, que os servidores já têm estabilidade e estavam trabalhando em casa durante a pandemia e que, por isso, não seria razoável pedir aumento de salário.
“Depois acabou a crise da saúde, os gastos com a saúde diminuem e este ano sim podemos aumentar. É assim que acontece na Alemanha, nas modernas democracias”, concluiu Guedes.
A reforma administrativa do governo, com mudanças nas regras do serviço público, foi apresentada em 2020 ao Congresso Nacional, mas ainda segue parada no Legislativo.
A previsão de Guedes é de uma economia adicional de R$ 300 bilhões em dez anos, se aprovada a reforma enviada ao Legislativo. Entre as mudanças, ela acaba com a estabilidade de parte dos futuros servidores.
A redução dos gastos com servidores, segundo o governo, está reduzindo o tamanho do Estado, um objetivo declarado do ministro da Economia, e impactando os serviços públicos.
Além do ajuste nas despesas com servidores, Guedes também defende privatizações de empresas estatais e uso de “vouchers” para saúde e educação no setor privado, entre outras medidas.
Reajustes e concursos
A queda dos gastos com servidores se dá após anos sem reajustes salariais. O último aumento foi anunciado em 2018, pelo então presidente Michel Temer.
Inicialmente, teria validade no ano de 2019, mas na época a equipe econômica convenceu Temer a reajustar os salários de 2020 em diante. Foi escalonado em cinco anos.
Em 2019, o ministro Guedes, disse que o governo poderia “travar” os concursos públicos”.
Em 2020, foi aprovada uma lei que vetou os aumentos de salário até o fim do ano passado, por conta da pandemia da Covid-19, medida que foi classificado pelo ministro Guedes como uma “granada no bolso do inimigo”.
Ao mesmo tempo, o governo limitou concursos públicos nos últimos anos, autorizando vagas para recomposição de força de trabalho. Entre os órgãos com autorização, estão a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal. Em 2022, foram autorizados 41,7 mil cargos.
Neste ano, o governo acena com um aumento de 5% para todas as categorias, mas a proposta tem sido rejeitada pelos servidores públicos – o que tem levado a manifestações nos últimos meses. Servidores do Banco Central e do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), por exemplo, estão em greve.
Os sindicatos do BC, da Receita Federal e do INSS também pedem, além do aumento, a realização de concursos. Nos últimos anos, o número de servidores contratados por meio de concursos públicos vem recuando.
Com a redução das contratações, a taxa de reposição de servidores — ou seja, contratações para repor aqueles que estão deixando o serviço público — tem ficado abaixo de 100% desde 2016, quando somou 103%.
Em 2017, 2018, 2019, 2020 e 2021, por exemplo, somou 69% 59%, 32%, 39% e 37%, respectivamente, segundo dados do Ministério da Economia.
Com isso, o número de servidores ativos permanentes do Executivo tem recuado, atingindo 501,4 mil no fim do ano passado.
Esse conceito não engloba os contratos temporários, os médicos residentes, os ocupantes de cargos em comissão sem vínculo com a União e os profissionais do Mais Médicos.
De acordo com o Ministério da Economia, a redução da taxa de reposição de servidores aposentados se concentrou, nos últimos anos, naqueles que ocupavam cargos “obsoletos”, como datilógrafos, chaveiros e ascensoristas.
Além disso, o ministério explica que o processo de digitalização de serviços públicos, como a solicitação do seguro-desemprego e a obtenção da carteira de trabalho, entre outros, está gerando economia para os cofres públicos e reduzindo a necessidade de servidores ativos.
Posição dos servidores
Rudinei Marques, presidente do Fórum Nacional das Carreiras Típicas de Estado (Fonacate), que lidera as mobilizações para reajustes salariais, afirmou que o serviço público passa por uma “situação dramática” que reflete o “descaso” com que o governo federal vem tratando os servidores.
“O INSS está com 2,7 milhões de benefícios atrasados, afetando a população vulnerável. A Controladoria-Geral da União está com o menor quadro de pessoal da história. A área de Planejamento e Orçamento precisaria de três vezes mais servidores. Isso se reproduz em quase toda as áreas. O quadro de pessoal está menor do que tínhamos em 1991, e a população cresceu mais de 30%”, declarou.
Apesar desse quadro, o sindicalista observou que a máquina pública está inchada com militares nos cargos de liderança.
O número passou de 1,4 mil no governo Luiz Inácio Lula da Silva para mais de 6 mil militares na gestão Bolsonaro, segundo Marques. Para ele, a indicação de militares sem “vasto currículo” relacionado com suas áreas de trabalho compromete a qualidade do serviço prestado.
“Depende muito de que serviço público o governo quer entregar para a população. Talvez não seja essa a pretensão [prestar um serviço de boa qualidade]. Você viu como foi a gestão na área de saúde na pandemia. De repente, não é essa a intenção”, disse Marques.
Para ele, é preciso acelerar o processo de contratação via concursos públicos ou a máquina pública entrará em “colapso”.
Apesar da ausência de reajustes aos servidores por anos, o sindicalista avaliou que a busca por vagas no setor público segue elevada.
“Estamos em um país com mais de 60 milhões de trabalhadores que estão no desalento, no desemprego ou na informalidade. Então, continua ainda atraindo porque não tem opção. Mas a remuneração do grande contingente do funcionalismo caiu muito”, disse.
Reprodução: G1
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