Tirania pós moderna

Tirania pós moderna

Por Luiz Paulo Vellozo Lucas

Ruth Scurr é historiadora, biógrafa e professora da Universidade de Cambridge, onde leciona história e política. Ela publicou em 2006 “Pureza Fatal: Robespierre e a Revolução Francesa.” O livro examina a vida do líder revolucionário francês, explorando sua transição de advogado provinciano a figura central do período do Terror. A professora Scurr mostra que a luta obsessiva de Robespierre em busca de uma “república da virtude”, o levou a radicalização crescente e a liderança de execuções em massa, até a sua própria morte na guilhotina aos 36 anos.

O Comitê de Salvação Publica, liderado por Robespierre, perseguia implacavelmente os inimigos da Revolução, monarquistas, moderados, clero e suspeitos em geral que podiam ser presos e executados na guilhotina. Cerca de 16 mil pessoas consideradas opositoras foram mortas até que a crescente revolta contra a radicalização política e a repressão violenta levasse a queda de Robespierre, a extinção do Comitê de Salvação Publica, a derrota politica dos Jacobinos e a ascensão das forças moderadas.

A radicalização política possui um enorme poder de atração. A opinião pública se comporta como manada atraída pela força da ação extremista e da narrativa que a acompanha, simples, lógica e verossímil. As massas sem rosto cheias de ódio e certezas, adotam e endeusam um líder salvador como foi Robespierre. O livro da professora Scurr traça um perfil preciso do chefe jacobino em sua obsessão pela pureza revolucionária, analisa com profundidade a psicologia do radicalismo que traz em si, invariavelmente, o germe de sua própria destruição.

Donald Trump é um tirano pós moderno. Como os jacobinos, os mafiosos e todos os tiranos em regimes totalitários, usa o medo como arma principal. Aprendeu a fazer demagogia política com Roy Cohn, advogado e procurador que atuou no período do “macarthismo” nos Estados Unidos nos anos 50, ajudando a condenar e executar na cadeira elétrica o casal Julius e Ethel Rosenberg, acusados de espionagem pró soviética nunca provada.

Seu mundo particular é o espaço virtual onde exercita seu discurso deformado e mentiroso. Nos canais on line agita suas ameaças de uso e abuso dos instrumentos de poder da presidência dos EUA contra os adversários da hora, espalhando incerteza e medo em escala mundial.

É também na dimensão imaterial das redes sociais e plataformas digitais que Trump faz negócios manipulando e ganhando dinheiro com ações no mercado de capitais e com criptomoedas.

Escorado nos interesses comerciais bilionários das Big Techs, empenha-se em impedir qualquer regulação que imponha restrições aos negócios digitais por governos de outros países. Empunha a bandeira da liberdade de expressão e da defesa dos interesses comerciais de empresas americanas contra praticas de “unfair trade”.

A sua narrativa é mais falsa que nota de três reais. Ainda assim, grande parte da opinião publica norte americana acredita e apoia Donald Trump em sua fantasia de herói da liberdade e defensor dos interesses da América.

A politica externa do governo Lula é muito ruim mas não pode ser responsabilizada pela agressão absurda de Trump ao Brasil e à economia brasileira. A briga de verdade é sobre a regulação da internet e dos negócios bilionários do universo virtual. O clã Bolsonaro achou que iria pegar carona na guilhotina tarifaria Trumpista para reforçar sua conversa fiada de vítima das instituições da democracia brasileira.

O resultado foi o contrario do pretendido. As investigações comerciais subsequentes encomendadas por Trump, ameaçam o PIX e o comércio da Rua 25 de março em São Paulo oferecendo munição extra, de grande apelo popular, para o governo Lula.

Para muito além das narrativas mitológicas que habitam o mundo virtual encontram-se os dramas e os medos do mundo real. O bolsonarismo perderá a hegemonia da oposição ao Lulo petismo e o governo tem uma nova oportunidade para assumir a liderança do país a partir dos interesses nacionais, reforçando assim sua força  eleitoral em 2026.

A bola está no campo da oposição não bolsonarista.